Crítica We Are Lady Parts S2: as muçulmanas que arrasam no punk

Com o intuito de desafiar o estigma que há com relação ao que significa ser uma mulher muçulmana atualmente, a cineasta britânica de origem paquistanesa Nida Manzoor recorreu ao seu passado para entregar uma obra fenomenal.

Trata-se de We Are Lady Parts, comédia centrada em uma banda de punk formada apenas por mulheres muçulmanas. Em sua segunda temporada, com seis episódios curtos, a série cumpre sua missão de mostrar com muita comédia e música boa o quão tridimensionais são suas protagonistas.

É difícil não se apaixonar pela novata Amina (Anjana Vasan), que precisa superar o nervosismo ao subir no palco; a tempestuosa Saira (Sarah Kameela Impey), líder de espírito mais rebelde; a feroz Ayesha (Juliette Motamed), que ainda enfrenta percalços com o fato de ser queer; a doce Bisma (Faith Omole), única com família já formada, inclusive filha; e Montaz (Lucie Shorthouse), a agente do grupo com grandes sonhos e inseguranças.

Manzoor, que é criadora, roteirista e diretora, consegue entregar um segundo ano ainda mais potente que o primeiro. Seu humor peculiar, quase pastelão por vezes, encaixa perfeitamente com as partes dramáticas e nos dá a sensação de estarmos vendo algo único, não mais do mesmo.

São muitos momentos que poderiam ser pontuados aqui. Gostaria de trazer apenas três como bons exemplos do quanto a atração é especial.

O primeiro é a participação especial de Malala, a mais jovem vencedora do Nobel da Paz. Foi apenas uma música, a ativista nem mesmo tem falas, mas foi surpreendente e tão lindo. Mostra como We Are Lady Parts consegue sensibilizar ao mesmo tempo que desafia regras.

Outro bom exemplo é a dúvida de Bisma, mulher negra que quer deixar de usar hijab sempre. Seu medo é de que as outras pessoas pensem que ela está abandonando sua fé com este ato. É muito interessante perceber que, de modo geral, as pessoas têm muita dificuldade para dissociar fé e religião. Fé é algo muito íntimo seu, você pode crer em deuses ou não, enquanto a religião é uma instituição ligada à vivência em comunidade e com regras próprias. Creio que teremos sociedades muito mais sadias quando as pessoas perceberem que podem professar sua fé como bem entendem, sem amarras.

O exemplo final é o mais dilacerante dos três. Após o grupo assinar com uma grande gravadora, Saira é censurada quando tenta fazer letras com teor político mais explícito. Essa censura é tão forte que se materializa na série com o fato da personagem não conseguir falar a palavra guerra. A personagem tenta o máximo possível, mas “war” simplesmente não aparece de forma alguma. É uma construção brilhante que termina, nos créditos do episódio, com a canção de uma musicista palestina. Funny Muslim Song, o capítulo em questão, já entra na lista dos melhores do ano. Sem em nenhum momento citar o genocídio perpetrado por Israel, a produção consegue fazer uma perfeita crítica do quanto o Ocidente cala vozes que ousam dizer algo que lhes desagrada.

Bravo.

Encerro com esta música linda que faz parte da trilha do segundo ano da série: Left Right, de Ali Sethi, Shae Gill, Abdullah Siddiqui & Maanu.

Nota (0-10): 10

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