A empresa Lumon criou um programa “revolucionário” que, ao ser instalado no cérebro, consegue fazer uma ruptura de memória. O funcionário que aceitar passar por esse processo terá, na prática, dois eus: o normal vivido até então e outro sem lembrança alguma, que poderá ser executado ao entrar nas dependências do trabalho. Ao sair, troca-se de personalidade como troca de HD externo e um eu não sabe o que o outro fez ao estar ativo.
Essa é a sombria premissa de Severance, drama criado por Dan Erickson. A produção é, até agora, a mais inventiva e instigante série a estrear em 2022. Um trabalho que é capaz revelar-se lentamente sem em nenhum momento ficar maçante.
Para além do ponto de partida já dito, pretendo falar o mínimo possível sobre a trama, dirigida com maestria por Aoife McArdle e Bem Stiller – sim, o protagonista de comédias duvidáveis tem se mostrado cada vez mais certeiro no seu trabalho atrás das câmeras, primeiro com Escape at Dannemora e agora com Severance. Ambos os projetos foram filmados com uma rigidez estética magnífica, sem deixar de lado a criatividade.
Tratando-se do elenco, a nova produção da Apple TV+ traz muitos nomes competentes: Adam Scott como Mark Scout; Patricia Arquette como Harmony Cobel; John Turturro como Irving; Britt Lower como Helly.
Com exceção de Zach Cherry e seu Dylan, uma espécie de alívio cômico capenga e por vezes irritante, todo mundo tem uma função específica e não parece ser adição gratuita. Diversos personagens que fazem mover aquilo que pode ser considerado uma crítica ao universo empresarial.
Se não há escrúpulos no mundo capitalista real, o mesmo pode ser dito numa ficção que monta um altar para a máquina econômica. Aquilo que deveria ser apenas um emprego vira um culto. Deferências são feitas a todo momento àqueles que deram mais engenhosidade ao deus dinheiro.
O resultado é uma cultura que ilude e massacra. Uma verdadeira prisão para quem não sabe o que é ir para casa ou dormir.
Também é uma possibilidade de libertação para o público.
Nota (0-10): 9