Crítica Them S1: terror, racismo e violência

Após um crime brutal, a família Emory, com integrantes negros, deixa a Carolina do Norte para trás e muda-se para um bloco com apenas pessoas brancas em Compton, na Califórnia. Estamos na década de 1950, durante a chamada Segunda grande migração, quando mais de cinco milhões de afro-americanos abandonaram o sul de Jim Crow em busca de uma vida melhor no nordeste, centro-oeste e oeste dos Estados Unidos.

Esse contexto histórico é muito importante para a narrativa de Them, antologia criada por Little Marvin que tem o subtítulo de Covenant em sua primeira temporada. A produção de terror aborda o racismo da época e tem despertado reações mistas por causa da enorme violência mostrada em tela.

Tecnicamente falando, a série é um grande acerto. A fotografia excelente ressalta os detalhes de uma direção de arte que te faz imergir no passado. O figurino bem desenhado veste com perfeição um elenco digno de prêmios. Deborah Ayorinde e Ashley Thomas, que vivem respectivamente Lucky e Henry Emory, o casal de protagonistas, são muito exigidos durante os dez episódios e entregam o esperado. Surpreendem-nos tanto quanto a trilha musical, com batidas que dão vigor extra às cenas.

Muito se compara esta série antológica com Lovecraft Country, já que ambas estrearam com poucos meses de diferença e levam o assunto do racismo para o terror. Apesar de um ponto de partida similar, vale ressaltar que são atrações muito diferentes – enquanto Them realmente mergulha no gênero, a produção da HBO soa infantil por causa de sua trama tresloucada.

Isso quer dizer que a criação de Little Marvin é boa? Sim, mas precisamos levar um pouco mais a fundo a discussão sobre sua violência. Vejam bem, gostei muito de A Serbian Film, película que faz forte crítica social por meio de cenas grotescas. Logo, não tenho problemas com a violência, mesmo quando sua validade seja questionável. Todavia, uma coisa é pegar um ser abstrato ou que represente toda uma nação, sem identidade única, para sofrer. Outra é mirar uma parcela da sociedade historicamente vítima de preconceito e violência e quase destruí-la em cena.

Não sou negro, não tenho como saber como uma pessoa negra se sente assistindo à série. Entretanto, sou queer e faço um pequeno exercício de imaginação: se fosse um casal gay sofrendo o que os Emory sofrem na ficção, me sentiria confortável em acompanhar?

A resposta é não. A sociedade nos violenta tanto no dia a dia que, por mais que eu entenda o ponto da crítica, não conseguiria acompanhar tanta perversão em um show. Não acho que o intuito tenha sido de explorar o sofrimento negro, mas faltou tato.

Por mais que seja chocante, não tive problemas com o trecho em que morre um bebê. Ou que alguém é enforcado. A violência faz parte do gênero. Contudo, o mais singelo tapa ganha outro caráter quando se trata não apenas de entretenimento, mas de dores reais sentidas por um povo que já foi inclusive escravizado.

Há ideias ótimas em Them, como Betty Wendell (Alison Pill) odiar negros, mas seus reais monstros serem os homens brancos. Isso é formidável. No entanto, o projeto como um todo deveria ser melhor pensado.

Nota (0-10): 7

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