Após mais de cem horas de tensão na Casa da Moeda da Espanha, finalmente chega ao fim um dos roubos mais mirabolantes já vistos. Com a segunda parte liberada pela Netflix, a minissérie La Casa de Papel, uma criação de Álex Pina, encerra a história que conquistou uma legião de fãs.
Assim como em sua primeira parte, o enredo avança sem perder o fôlego. As reviravoltas são capazes de nos prender até o desfecho, que provavelmente é o melhor possível. Em uma trama tão cheia de idas e vindas, logo ficou claro que uma vitória plena para qualquer um dos lados seria demasiado frustrante. Sendo assim, o que temos é um certo equilíbrio tratando-se de perdas – uma forma de satisfazer o público sem transformar tudo num mar de rosas.
Apesar de uma resolução acertada, coerente com a proposta e a trajetória, não podemos deixar de mencionar que nem tudo funcionou tão bem. As falhas ficaram mais evidentes nos últimos nove episódios. Talvez o tempo de lançamento entre os capítulos tenha ajudado a criar um distanciamento que, ao assistir à última leva, permitiu certo desconforto.
O primeiro estranhamento refere-se ao pouco caso dos roteiristas tratando-se dos reféns. Há muitos deles, há dias sofrendo, e eles perdem relevância na trama. O que eles estavam fazendo durante as muitas discussões entre os assaltantes? Estes reuniam-se para brigar e, enquanto isso, ninguém pensava em um plano de fuga melhor que aquele orquestrado pelo babaca do Arturo (Enrique Arce)?
Se os protagonistas não estavam brigando, amavam-se em excesso. Temos tanto para abordar e a produção apegou-se demais aos romances que simplesmente não são tão coerentes com a situação. É até possível aceitar que Mónica (Esther Acebo), uma refém, apaixone-se por Denver (Jaime Lorente) e, em contraponto, Ariadna (Clara Alvarado) sofra nas mãos de Berlim (Pedro Alonso). Todavia, Raquel (Itziar Ituño) também cair de amores pelo Professor (Álvaro Morte) em tão pouco tempo é exigir que a gente releve demais o quão descabível isso é.
Toda a energia direcionada para tais amores seria muito melhor utilizada na questão mais fascinante da série: quem são os verdadeiros vilões? Em um de seus discursos, o professor fala sobre o dinheiro entregue a bancos, aos seus donos, que são muito ricos.
O grupo de assaltantes preocupa-se em deixar a população ao seu lado. O povo, todavia, nunca aparece na série. Os noticiários entram em cena ocasionalmente, apenas quando estritamente necessário. No entanto, poderiam estar mais presentes. Seria muito mais grandioso se a atração abordasse a fundo o papel da sociedade e da imprensa no desenrolar do ato.
Assim, focando apenas no Estado, através da polícia, e nos autores do crime, parece ter uma lacuna – que é preenchida com falas dispersas sobre a movimentação de quem não está diretamente envolvido na questão.
Leia a crítica de La Casa de Papel S1
Claro que a falta desses ingredientes não deixa a história menos envolvente – apenas menos reflexiva, talvez. Em contrapartida, discute-se sem meias palavras o sexismo e ficamos empolgados com a ascensão de Nairóbi (Alba Flores), que definitivamente rouba nossos corações.
Mesmo exigindo que o público releve alguns excessos, a produção termina com um saldo positivo. Não seria ruim se tivesse continuação, não é mesmo?
Nota (0-10): 7